Encontrando os culpados pelo mito
Se a esfericidade da Terra não era questionada nos círculos eruditos da Idade Média então quem inventou o mito da Terra plana? (ou mais apropriadamente: o mito de que as pessoas acreditavam que a Terra fosse plana).
O historiador J. B. Russel, no livro "Inventing the Flat Earth" ("Inventando a Terra Plana" - 1991), procurou os responsáveis pela propagação do mito e descobriu dois culpados: o francês Antoine-Jean Letronne (1787-1848) e o americano Washington Irving (1783-1859). Letrone, um historiador muito respeitado mas com um grande preconceito religioso, foi responsável por atribuir ao "Topografia Cristã" de Cosmas Indicopleustes uma importância histórica que ele nunca teve, concluindo que todos na Idade Média acreditavam que a Terra era plana. Cosmas por exemplo, foi considerado um tolo ignorante pelo filósofo grego cristão John Philoponus (490-570). Muito antes disso, Santo Agostinho (354-430), doutor da Igreja, no seu livro "A Cidade de Deus" (De Civitate Dei), escreveu: "Apesar de estar supostamente ou cientificamente provado que a Terra tem a forma esférica, disto não decorre que o outro lado do mundo seja desprovido de mares, nem decorre imediatamente que, sendo desprovido de mares, seja habitado."
Pensar como Irving , seria como se daqui a mil anos alguém encontrasse um obscuro trabalho científico questionando a Genética e afirmasse que os cientistas do século XXI não acreditavam na Genética. Segundo Russel, devido ao enorme prestígio e reputação de Letrone, esta interpretação particular dos fatos não foi questionada pelos historiadores posteriores e passou a circular como verdade nos meios intelectuais.
Washington Irving, por outro lado, era antes de nada mais um romancista. Ele é o autor do conto que já virou desenho e filme: "A Lenda do Cavaleiro sem Cabeça". Como historiador entretanto, costumava levar sua habilidade de escrever ficção para suas biografias, romanceando fatos que nunca aconteceram. Segundo o pesquisador Owen Gingerich, em seu artigo "Astronomy in the Age of Columbus" ("Astronomia no Tempo de Colombo"; Scientific American, novembro de 1992), logo após a revolução americana Irving estava procurando por um herói não inglês para contrapor ao famoso explorador inglês Sebastian Calbot, o primeiro homem a chegar ao Polo Norte, e enxergou em Colombo a pessoa certa.
Na biografia de Cristovão Colombo, "Columbus", publicada em 1828, Irving descreve um episódio real - o Conselho de Salamanca em que Colombo apresenta seu projeto a um grupo de religiosos e leigos - porém "enriquece" a narrativa afirmando que Colombo foi “acusado de heresia” por sustentar que a Terra fosse redonda, o que supostamente seria contrário às Escrituras. É verdade que Colombo sofreu sérias objeções das autoridades católicas presentes, mas a questão nunca foi se a Terra era redonda ou não, e sim o tamanho desta. Colombo supunha que a Terra fosse muito menor do que é na realidade (considerava-a com apenas 20% de seu tamanho real), enquanto seus opositores diziam ser impossível chegar às Índias percorrendo uma distância que consideravam muito maior (os opositores de Colombo estavam certos; se a América não estivesse no meio do caminho de Colombo ele e sua tripulação teriam morrido à míngua de recursos). A narrativa conforme floreada por Irving transformou o debate de Salamanca em um símbolo da luta entre o “campeão da liberdade científica” e o dogmatismo teólogico, e caiu no gosto popular como mentira preferida.
Letrone deu ao mito da “Terra plana” sua base “histórica”, Irving sua carga emocional que embriaga os incautos, e o mito ganhou a força que tem até hoje. Pegando um gancho no embuste, John Draper (1811-1882), um físico violentamente anti-católico, publicou em 1873 o livro "A História do conflito entre a Ciência e a Religião", utilizando o mito da “Terra plana” como exemplo de que as crenças religiosas eram “estúpidas” e “atrasadas” e necessariamente “se opunham ao progresso da ciência”. Através de Draper o mito da “Terra plana” chegou como verdade absoluta até o início do século XX, e só nos anos 20 começou a ser questionado.
3 Maneiras de Provar que a Terra é redonda
Desde a Antiguidade até boa parte da Idade Média, a opinião comum sobre a forma de nossa planeta era basicamente que fosse plano. Como uma estrada ou uma cidade. Evidentemente, sempre houveram os revolucionários que descobriram que isso não era verdade (Aristarco de Samos, Eratóstenes, Santo Agostinho...) e que, realmente, a Terra era esférica. Entretanto, a opinião destas pessoas não convergia com a ordem das coisas apresentada pelos grandes pensadores de suas épocas.
De fato, até mesmo hoje, quando dispomos de tecnologia suficiente para provar totalmente a veracidade dessa informação, ainda há pessoas que desconhecem o fato da Terra ser redonda.
Porém, há formas muito simples que podem levar a essas conclusões. Foi usando métodos simplórios que grandes mentes do passado deduziram a esfericidade da Terra, apesar de sua descoberta não ter sido valorizada. São esses métodos que você conhecerá agora:
1 - Mastros de embarcações
Se você tiver grande paciência e preferencialmente uma luneta também, você poderá ficar observando, pelo período de algumas horas, como os navios (ou qualquer embarcação) desaparecem no horizonte. Se a Terra fosse plana, a observação deveria mostrar que, quando eles somem, eles somem de uma vez só! Isto é, desaparecem somente no ponto em que a distância supera o raio de visão. Porém, o que você realmente veria, seria que a base das embarcações desaparecem primeiro! E, por último, os mastros dos navios. De fato, você veria a embarcação "descer" gradualmente no horizonte.
2 - Sombra da Terra
Essa é a mais simples de todas as formas de provar que a Terra é redonda. Quando observamos um eclipse lunar (que é causado pela sombra da Terra na Lua), podemos ver que a sombra projetada pela Terra é absolutamente redonda, desde o início do eclipse até quando a Lua é totalmente ocultada. Foi com estas observações que Aristarco de Samos, astrônomo e matemático grego, deduziu que nosso planeta era redondo.
matemático Eratóstenes, há mais de 2 000 anos, também é uma ótima maneira de comprovar que a Terra é esférica. Se considerarmos a sombra projetada em duas varetas, distantes suficientemente uma da outra, veremos que o comprimento das sombras é diferente. O que não deveria ocorrer em uma Terra plana.
Bônus - Coerência
Todos os objetos celestes que conseguimos observar no céu, sem exceção, são redondos. Por que nosso planeta deveria ser diferente?
Esta não é uma maneira de provar absolutamente a esfericidade da Terra, mas é um argumento bastante prudente e provido de muito bom-senso. Não faz nenhum sentido pensar que apenas nosso planeta fosse uma exceção, dentre os números incontáveis de objetos que somos capazes de observar.
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